sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Aeroporto

Ir embora é como morrer um pouco. Claro, sem a parte mórbida que cerca a morte, mas existem muitas semelhanças. Quando alguém vai embora, para longe e por muito tempo, deixa para trás os lugares, coisas e pessoas com quem convive - em suma, a própria vida.
Alguns podem argumentar que é exagero. Diriam que pessoas e lugares não mudam tanto assim, visto que carregam uma essência imutável. É verdade. Contudo, não se pode negar que as pessoas evoluem, crescem (às vezes para baixo) e invariavelmente mudam. Os amigos e familiares que o viajante encontra no retorno não são os mesmos que lhe deram adeus na ida, pois envelhecem, engordam, pintam o cabelo, pulam de bungee jumping. Serão "velhas pessoas novas".
Os lugares também mudam. É bem verdade que em um ritmo mais lento que as pessoas, mas mudam. Arriscando um cálculo tosco, diria que uma cidade como Porto Alegre muda em dez anos o que uma moça de vinte muda em dois.
Restam as coisas, essas não mudam. O viajante, então, se utiliza delas para criar uma ligação quase mediúnica com sua "vida passada". Seja pelas fotos, cd’s ou miniaturas de porquinhos que se colocam na cabeceira. Essas coisas vão junto para que o viajante se lembre quem foi na última encarnação.
Por que ir embora então? Por que cometer tal "suicídio"?
Ora, morre-se na ida; nasce-se na chagada. O aeroporto do destino é a nova maternidade. O viajante que souber ser como o bebê - curioso e interessado pelos novos ambientes e pessoas - tem tudo para se dar bem. Os bebês não estão apegados as suas vidas passadas, tampouco trazem consigo souvenirs da última encarnação. Sorte dos bebês.

domingo, fevereiro 19, 2006

Sentimentos

Sentimentos estão por toda parte. Quando não se ocupam em perambular pelo coração de alguém, estão a voar, flutuar por aí, lépidos, descompassados, às vezes intransigentes em suas escolhas e rumos. É algo curioso, curiosíssimo: a gente está caminhando pela rua e, do nada, pá!: um sentimento alcança a gente. Pode ser uma menininha bonita, uma criança de rua ou um distinto senhor que nos lembra o pai, ou o avô. A gente está andando, sem nada no peito, numa indiferença atroz para com nós mesmo, e vem um sentimento e dá um basta em todo o excesso, em toda a insensatez, e abarca o mundo todo - e o preenche. E a gente sente.

Os sentimentos também assumem várias formas: podem ser, num domingo, no cantar da gente que passa, uma camisa de um time de futebol. Uma cadeira de balanço. Um peão, uma florzinha, o mar. A geografia, o tato do sentimento são meio irregulares: de vez em quando bate na gente, com força e impaciência, indignados com a nossa cegueira. Outras vezes, só nos cutuca, a gente olha para ele meio de soslaio, e ele pisca pra nós. Seja com truculência, seja com malícia: o sentimento nos avisa. É bom poder sentir.

Sentimentos também se transportam. Vão a terras inacessíveis, conhecem outros sentimentos semelhantes seus, iguais ou parecidos, com eles se juntam, deles se separam e voltam ao lugar de origem, ou não. Depende do destino, da estrada, de quem vai e quem volta. Sentimentos fazem check-in, pagam taxa de embarque e andam de avião. Mas deixam uma coisinha por onde estiveram. Um pedacinho de si mesmos.

Os sentimentos se comportam como eternos turistas. Por mais que andem por todos os lados, não são tão volúveis: é como se tirassem fotos das paisagens que conheçeram, para que não se esqueçam de onde estiveram. Aí, de vez em quando olham o seu próprio álbum. E voltam.

Tchau, Eduardo. Tchau, Carol. Boa viagem para vocês.

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Despedida

Naquele domingo à noite, sentiu-se triste. Melancolia de quem antevê a perda que irá lamentar em breve. Há, de fato, o que lamentar. Nunca, ou quase nunca, dissera o que sentia ao encontrar-se entre amigos, velhos e recém-chegados. Temia uma má interpretação do sentimentalismo que brotaria de suas palavras enfadonhas. Temia, sobretudo, a reação de seus queridos interlocutores: do previsível sorriso enternecido e já nostálgico ao silêncio que perpetuaria a sensação de impotência frente ao destino, à própria vida.

E assim é. Naquele domingo, após uma grande noite em que a amizade enchia os corações e os rostos, a certeza da separação mostrou-se, cândida e paciente. Pois, se o imprevisível exibe-se à frente de quem vai, a descoberta do novo compensa-lhe, ao menos. Resta apenas partir e ficar, e esperar o reencontro - para o qual estarão, talvez, mais sábios e mais amigos. E despedidas sempre são complicadas...

terça-feira, fevereiro 07, 2006

Voltei!

Aí pessoal, consegui voltar de Buenos Aires ruim do estômago e com febre. É, consegui a proeza.

Conclusões:

1) A quantidade de lugares legais para se comer em Buenos Aires é uma ameaça a todos os regimes que a mente humana possa criar. E olha que eu me segurei. É massa, é carne, é café com isso, é café com aquilo, é doce, é torta... Nossa mãe!

2) O Tango está meio "feito para turistas", apesar de ser muito bonito de se ver nas ruas. Não fui a nenhum show, mas ouvi bastante por lá. O Caminito é obrigatório, mas tudo lá é feito para a extorsão dos turistas - a maioria cai, feliz da vida - e, como me disse um taxista, "existem uns trinta bairros, no mínimo, mais 'tangueros' que o Caminito em Buenos Aires".

3) A gente consegue dispensar vários táxis se usar bem o subte (trem subterrâneo), o ferrocarril (trrem como o nosso) e os ônibus lá.

4) As argentinas portenhas tentam compensar com alguma atmosfera de segredo calculado seus poucos dotes de beleza. Mulheres bonitas, em Buenos Aires, normalmente estão falando outra língua. No mais, os portenhos me pareceram na sua maioria educados e prestativos ao ajudar os turistas.

5) Futebolisticamente: as torcidas não cantam o tempo todo, quem canta mesmo normalmente fica atrás da goleira e, na média, o nível do futebol argentino me pareceu inferior ao nosso. o jogador do momento é o atacanta Aguero, do Independiente. Já tem gente que quer vê-lo na Copa. O Boca é um caso á parte: às 12h de domingo, para um jogo às 19h, já tinha fila de 500m para comprar as populares que sobraram da venda antecipada. O Boca jogou com o Lanús, o Paraná deles, e a Bombonera estava quase lotada. Ah, muita gente na Argentina não gosta do Maradona como pessoa. Eu fui a cinco jogos.

Acho que era isso.

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