sábado, setembro 10, 2005
Crônica do Reino das Coisas Invertidas
Sempre ouvira falar do tal lugar. Tinha apenas alguns poucos anos de vida, mas o Reino das Coisas Invertidas habitava febrilmente sua mente infantil. "É verdade que lá tudo está ao contrário?", perguntava, insistente e sedenta de curiosidade. "Meu tio disse que as pessoas ficam de cabeça para baixo e as coisas sobem quando caem", confidenciou a amiga, pequena como ela, numa tarde de sol no jardim.
Partiu sozinha. Precisava saber se era verdade o que diziam. Sua mente jovenzinha e latente não poderia suportar mais essa improbabilidade. No caminho, esforçava-se por lembrar de que o Reino era o próprio inverso. As placas indicavam: "esquerda". Tomava, então, o rumo da direita. "Direita", e lá se ia ela para a esquerda. Tortuoso, o caminho.
Não lhe foi difícil, no entanto, encontrar o rumo do Reino. Esperta e vivaz, desobedeceu a lógica, contrariou a razão, negou o bom senso e chegou a uma placa estranha, envelhecida pelo pouco tempo e colorida por cor nenhuma: Invertidas Coisas do Reino ao Vindo-Bem.
Pediram-lhe que fechasse o portão para entrar. A dúvida lhe transfigurou o rosto corado, permaneceu paralisada. Um guarda apresentou-se para ajudá-la. "Diga-me, menina, que queres aqui?", indagou o oficial da lei. Ela se voltou e nada havia ali. Ergueu os olhos e viu um homem moreno e magro, queimado do sol, pisando sobre o céu. Explicou-lhe que gostaria muito de visitar o Reino e saber como funcionavam as coisas naquele estranho e improvável país. O homem pediu que olhasse às costas, indicando-lhe o caminho que havia feito até chegar ali.
Era realmente fantástico. Havia muitas árvores e suas raízes penetravam o firmamento. As águas, cristalinas como nunca havia visto antes, dançavam muitos quilômetros acima do chão e formavam um magnífico espelho. Os animais, pequenos e grandes, corriam com as patas para cima e erguiam-se na direção da terra. A fumaça das fábricas ocupava o lugar das nuvens, e as nuvens, o da fumaça.
As pessoas, lá no alto, pareciam não notar a minúscula visitante, que pôs-se a caminhar. Observava tudo, atentamente, e a confusão tomou-lhe por completo. Os olhos distantes, para cima, a testa franzida, o queixo apontando a direção do cosmo...
Achou tudo muito estranho, contou depois. O forte dizia ser o fraco - "e todos lhe acreditavam!". Os ricos blasfemavam e os pobres sorriam complacentes. Quem tinha mais, muito mais recebia. Quem pouco tinha, concentrava grandes quantidades de pouco ou nada. Mas ficou seriamente desconsertada ao ver o Cristo, braços abertos, de cabeça para baixo, sustentando um morro inteiro com os pés. "Que gente mais esquisita", repetia, prometendo nunca mais voltar ao Reino, pleno de incoerência.
Partiu sozinha. Precisava saber se era verdade o que diziam. Sua mente jovenzinha e latente não poderia suportar mais essa improbabilidade. No caminho, esforçava-se por lembrar de que o Reino era o próprio inverso. As placas indicavam: "esquerda". Tomava, então, o rumo da direita. "Direita", e lá se ia ela para a esquerda. Tortuoso, o caminho.
Não lhe foi difícil, no entanto, encontrar o rumo do Reino. Esperta e vivaz, desobedeceu a lógica, contrariou a razão, negou o bom senso e chegou a uma placa estranha, envelhecida pelo pouco tempo e colorida por cor nenhuma: Invertidas Coisas do Reino ao Vindo-Bem.
Pediram-lhe que fechasse o portão para entrar. A dúvida lhe transfigurou o rosto corado, permaneceu paralisada. Um guarda apresentou-se para ajudá-la. "Diga-me, menina, que queres aqui?", indagou o oficial da lei. Ela se voltou e nada havia ali. Ergueu os olhos e viu um homem moreno e magro, queimado do sol, pisando sobre o céu. Explicou-lhe que gostaria muito de visitar o Reino e saber como funcionavam as coisas naquele estranho e improvável país. O homem pediu que olhasse às costas, indicando-lhe o caminho que havia feito até chegar ali.
Era realmente fantástico. Havia muitas árvores e suas raízes penetravam o firmamento. As águas, cristalinas como nunca havia visto antes, dançavam muitos quilômetros acima do chão e formavam um magnífico espelho. Os animais, pequenos e grandes, corriam com as patas para cima e erguiam-se na direção da terra. A fumaça das fábricas ocupava o lugar das nuvens, e as nuvens, o da fumaça.
As pessoas, lá no alto, pareciam não notar a minúscula visitante, que pôs-se a caminhar. Observava tudo, atentamente, e a confusão tomou-lhe por completo. Os olhos distantes, para cima, a testa franzida, o queixo apontando a direção do cosmo...
Achou tudo muito estranho, contou depois. O forte dizia ser o fraco - "e todos lhe acreditavam!". Os ricos blasfemavam e os pobres sorriam complacentes. Quem tinha mais, muito mais recebia. Quem pouco tinha, concentrava grandes quantidades de pouco ou nada. Mas ficou seriamente desconsertada ao ver o Cristo, braços abertos, de cabeça para baixo, sustentando um morro inteiro com os pés. "Que gente mais esquisita", repetia, prometendo nunca mais voltar ao Reino, pleno de incoerência.
Comments:
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Juliano!
Muito bom!
Bela descrição de um país onde as pontes descem para navios passarem por cima...
Genial.
beijo!!!
Muito bom!
Bela descrição de um país onde as pontes descem para navios passarem por cima...
Genial.
beijo!!!
Ah, que ótimo isso, hein Jardel!
Esse texto me lembrou "O Carteiro e o Poeta" quando o dito cujo ficava perguntando para o Neruda o que são metáforas? Lembra?
Ironias, metáforas, ironias de novo, mais metáforas, mais versos, mais isso, mais aquilo...
Isso é bom, mas bem que um pouquinho de decência lá no Plalnalto também faria bem ao nosso senso lírico, não é?
Abraços e beijos recíprocos! Hehehe!
Esse texto me lembrou "O Carteiro e o Poeta" quando o dito cujo ficava perguntando para o Neruda o que são metáforas? Lembra?
Ironias, metáforas, ironias de novo, mais metáforas, mais versos, mais isso, mais aquilo...
Isso é bom, mas bem que um pouquinho de decência lá no Plalnalto também faria bem ao nosso senso lírico, não é?
Abraços e beijos recíprocos! Hehehe!
Tô cada vez mais gostando do blog. É um dos melhores que eu já li. Jardel matou a pau. Muito bom, garoto.
Muito boa essa idéia de blog comunitário.
Viva nós!
(todos levantam os copos agora)
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Muito boa essa idéia de blog comunitário.
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